Anjos do Sol


Crime cada vez mais frequente no Brasil, principalmente no nordeste do país, a prostituição infantil é o tema de Anjos do Sol, filme produzido e dirigido pelo cineasta Rudi Langemann, sendo seu primeiro trabalho solo.

Vista como uma nação onde a exploração de crianças e adolescentes é uma das maiores manchas e ao mesmo tempo um chamariz para o turismo sexual - em nossa terra tupiniquim estima-se que mais de cem mil jovens estejam sendo aliciados e colocados em situações de periculosidade, promovendo uma verdadeira movimentação financeira liderada por poderosos.

Através da protagonista Maria (grande acerto do roteiro que se utiliza propositalmente de nomes genéricos), conhecemos a dura realidade vivenciada por inúmeras crianças de zonas pobres do nordeste. Filha de trabalhadores humildes, Maria (Fernanda Carvalho) é vendida por um recrutador de meninas (formidável desempenho de Chico Diaz), que dá o pretexto de que garantirá melhores oportunidades de vida para a garota, e que em suas mãos ela estará protegida. Entretanto, o desconhecido está recrutando prostitutas para serem vendidas em um leilão, onde os compradores buscam satisfazer seus mais obscuros desejos. Da hasta rumo a um prostíbulo em meio a floresta amazônica, chefiado pelo violento Saraiva (Antonio Caloni, ótimo) - a protagonista é submetida às mais terríveis humilhações e violações, tendo apenas Celeste (Mary Sheila) e Inês (Bianca Comparato) - também vítimas de constantes abusos - como fortes aliadas.



Com um roteiro bem amarrado e sagaz, Langemann desenvolve o texto (também de sua autoria) com bastante cautela, oferecendo ao espectador uma produção que não se preocupa em levar o selo de filme denúncia, mas que o direciona para uma calamidade que tem afetado regiões do Brasil extremamente miseráveis e que carecem de atenção.

Proposto como uma saga, em que se acompanham as desventuras da jovem Maria, Anjos do Sol abriga um n números de antagonistas, todos desenhados com uma característica bem específica - tornando-se, cada um a sua maneira - essenciais para o conjunto. Do desengonçado (e quase cômico) caçador de meninas Tadeu à fria mulher da casa de leilão sexual (Vera Holtz) - passando pelo milionário (Otávio Augusto) que usa Maria para dar uma primeira noite para seu filho que completara 15 anos, chegando a Saraiva - punindo severamente quem foge de sua casa de favores sexuais - e a cafetina Vera (Darlene Glória) que tenta inserir a protagonista no mundo da prostituição carioca - quando ela escapa e vai para o Rio de Janeiro. Todas estas figuras enfrentariam o grande risco de cair no caricatural, transbordando de artificialidade - mas Rudi Langemann os construiu como personas reais e cheias de dimensões. O papel de Antonio Caloni, por exemplo - consegue ser intimidado por uma das moças do prostíbulo, que ele acredita estar grávida dele - mas age cruelmente em suas punições - já a cafetina de Darlene Glória mostra-se disposta a ajudar Maria, mas no fundo pensa no que pode ganhar aliciando-a. Esses personagens que poderiam cair no over acabam se magnetizando singularmente, atraindo a atenção e a repulsa do espectador paralelamente.

Lançado no Brasil em 2006, Anjos do Sol foi premiado em Gramado, levando inclusive para a casa o troféu de melhor filme. Tanto na qualidade técnica como em sua abordagem , o filme conseguiu ser bem sucedido, estabelecendo uma linguagem assimilável para tão grave tragédia social que tem atingido números alarmantes país afora. Há muitas Marias, Saraivas, Tadeus e Veras espalhados por aí, mas muitos não sabem que eles existem ou - o que é pior - fingem que não sabem. Estamos diante de mais uma triste realidade brasileira.



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