Encontro com o passado



Uma mulher que divide a vida de mãe, dona de casa e escritora , e é atormentada por sensações e visões que a levam para um passado desconhecido , que foi apagado de sua memória - despontando quando a imagem de uma outra mulher - bem diferente dela - surge em seus sonhos.

O drama Encontro com o passado ( Ne te retourne pas) - dirigido pela cineasta Marina de Van , roteirista de 8 Mulheres - de François Ozon - é por assim dizer uma experiência capciosa.

No longa, somos apresentados a Jeanne (Sophie Marceau) , autora de livros de ficção que está prestes a produzir mais uma de suas obras, meio a contragosto do editor , que prefere apostar no realismo. Somado ao stress causado pela discordância profissional , a personagem passa a ter constantes alucinações e a imagem de uma pequena garota que - aparentemente - quer guiá-la para algum lugar ou avisá-la de algo - se torna presente. Jeanne também começa a notar que alguns móveis de seu apartamento foram trocados de lugar sem seu conhecimento , o que causa entranheza em seu marido e seus filhos - que defendem que tudo está como sempre esteve. Paralelamente a tudo isso, a protagonista sente que seu corpo sofre alterações , adquirindo formas distintas e que seu cabelo perde a clara tonalidade - dando lugar a viçosas madeixas negras. Tal tormento se agrava quando ela não reconhece mais sua família , seus membros não são mais os mesmos, e em nada lembram aquelas figuras com quem convivia. Sua mãe - viciada em jogos , é seu porto seguro - e se mostra sempre calorosa e é justamente nela onde se esconde a resposta para tudo o que Jeanne está vivendo. Toda esta crise de indentidade , faz a personagem de Marceau - já no corpo de outra mulher (a italiana Monica Belucci) , mas com a mesma essência - partir para a Itália, em busca de alguém cujo imagem ficou registrada em uma foto tirada na infância.



Encontro com o passado - presente na mostra não competitiva de Cannes 2009 - é um filme que merece aplausos. A começar pelo afiado roteiro escrito por de Van em parceria com Jacque Akchoti que , ao decidirem centrar sua história em uma personagem comum , sem aqueles estereótipos meio que viciantes de figuras pertubadas e excêntricas - presentes em alguns filmes dramáticos - concedeu humanidade ao texto , se apoiando principalmente nos conflitos psicológicos que tentam esmagar sua protagonista - que sem cessar busca por respostas. Tal qual a bailarina de Natalie Portman em Black Swan em sua luta mental para externalizar aquele ser dentro dela - que não conseguia despertar , a Jeanne de Sophie Marceau - envolta por fantasmas em sua solitária guerra , a exemplo de Nina Sayers, beira ao abismo de uma iminente loucura. Em tempo , a direção de Marina de Van em certos pontos é bem semelhante à de Darren Aronofsky em sua recente produção. A diretora criou inclusive um ambiente onde o clima de terror é imposto em algumas cenas - colaborando com a narrativa. Também foi promissora ao evitar o uso excessivo dos batidos recursos de flashbacks, recorrendo com mais afinco ao impacto dos efeitos especiais - impressionantes por sinal - e do bem sucedido trabalho da maquiagem - para transmitir o mistério que cerca a personagem interpretada por Marceau e Bellucci. Aproveitando , a perfomance das duas atrizes é memorável. Costumamente em filmes onde há trocas de corpos, se bem que aqui não é exatamente o caso - existe a grande dificuldade de encontrar uma plena conexão entre os dois intérpretes, ficando sempre aquém do esperado. Monica Bellucci foi bastante minuciosa, ao incorporar todos os movimentos, os olhares e até mesmo o modo de falar derivados de Sophie Marceau. Correndo o risco de parecer exagerado, na minha opinião a entrega emocional dessas atrizes foi das coisas mais belas já vistas na tela do cinema - algo sublime para ser mais exato.

Fico realmente satisfeito quando me deparo com produções tão dignas e que - acima de tudo - não subestimam a inteligência do público. Temos aí mais um longa que merece entrar no rol dos melhores. É um filme como a muito tempo não se via.








1 Response to "Encontro com o passado"

  1. Kamila says:

    Adoro François Ozon e quero muito ver esse filme.

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